14.1.09

Golden Years II

Ontem, como todas as terças, tomei o pequeno almoço com uma senhora de outro tempo. Eu cheguei atrasado, um velho hábito meu, ela chegou sessenta e cinco anos mais cedo, como também costuma fazer. Sentámo-nos na mesma mesa de sempre, num canto do café encostados a uma grande janela. Ela sorri vendo os soldados que voltam para o quartel abraçados às prostitutas, enquanto eu me entristeço ao ver os netos obesos que balanceiam rua abaixo fardados de turistas.
Ali ficamos pouco mais de um quarto de hora a debicar os croissants, ela acompanha o seu com um cappuccino enquanto eu bebo um sumo de laranja seguido de um café curto curto. Nenhum de nós diz qualquer palavra, mas por vezes, sem que me aperceba, escapa-me a melodia murmurada de uma música que ela ainda não sabe cantar.
Ela olha para mim sem me ver e eu olho para ela sem ver mais nada. Vejo-a num caleidoscópio temporal feito de muitas personagens, diversos sorrisos e algumas lágrimas falsas (algumas não). Reprimo o meu desejo de a beijar imaginando que não é real (como se a realidade me fosse necessária para o que quer que seja) e fico ali a fumar sozinho ao vê-la levantar-se e caminhar elegante para longe de mim. Sem aceno nem adeus, sem nada.

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